Em dezembro de 2020, o Superior Tribunal de Justiça afetou como recurso representativo de controvérsia (Tema 1.079) os REsp nº 1.898.532/CE e 1.905.870/PR, a fim de definir se o limite de 20 salários mínimos é aplicável à apuração da base de cálculo de contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros (art. 14 da Lei nº 5.890/73).
A questão de direito controvertida surgiu após o advento do Decreto-Lei 2.318/1986, que, em seu artigo 3º, dispôs que: “Para efeito do cálculo da contribuição da empresa para a previdência social, o salário de contribuição não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo, imposto pelo art. 4º da Lei nº 6.950, de 4 de novembro de 1981”. Este último artigo, por sua vez, dispunha, em seu parágrafo único, que o mencionado limite se aplicava “às contribuições parafiscais arrecadas por terceiros”.
Por esse motivo, os contribuintes ajuizaram ações, questionando se a alteração trazida pelo Decreto-Lei 2.318/86 teve o condão de revogar o limite previsto no parágrafo único do artigo 4º da Lei 6.950/81, no que se refere às contribuições parafiscais, considerando a aparente antinomia das regras e o critério da especialidade.
O litígio foi apreciado pelo e. STJ, pela primeira vez, em 2008. Naquela oportunidade, foi firmado o entendimento de que o teto de 20 salários mínimos deveria ser observado na apuração das referidas contribuições a terceiros, visto que o Decreto 2.318/86 teria revogado apenas o caput art. 4º da Lei 6.950/81, de modo que permanecia vigente o seu parágrafo único. Esse entendimento estava sendo aplicado monocraticamente e foi reafirmado pela 1ª Turma da Corte Superior no início de 2020. Contudo, por não ter eficácia vinculante, os Tribunais Regionais Federais têm dado interpretações diversas sobre o tema.
A tese reiterada pelos contribuintes é de que aquela regra do mencionado Decreto não revogou, nem expressa, nem tacitamente, o parágrafo único do artigo 4º da Lei 6.950, tendo sua eficácia sido limitada única e exclusivamente à revogação do limite para a base de cálculo das “contribuições da empresa para a previdência social”. Ou seja, até em razão daquele critério da especialidade, estaria mantido referido limite quantitativo para a apuração das contribuições destinadas a terceiros.
A Fazenda Pública afirma que há impossibilidade jurídica de, no ordenamento brasileiro, manter-se em vigor um parágrafo (único) sem o correspondente artigo (caput) para lhe dar suporte, não havendo como se sustentar a revogação apenas do caput do referido artigo 4º e a vigência isolada de seu parágrafo único, com base na hermenêutica do artigo 10 da Lei Complementar nº 95/1998, segundo o qual a unidade básica articular de uma lei é o seu artigo . Assim, para o fisco, os valores pagos a título de contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros recairiam sobre o total da folha de salários.
Os terceiros a quem se destinam essas contribuições parafiscais, SENAI, SESI, SESC e SENAC, formularam pedido de intervenção nos recursos em trâmite no STJ, na qualidade de assistentes litisconsorciais da União Federal por força de substituição processual, sustentando que a União não é credora das referidas contribuições que lhes são devidas e, portanto, estaria a Fazenda Pública defendendo direito alheio, sendo mera substituta processual. Os pedidos ainda não foram analisados.
Importante destacar que há uma terceira linha de fundamentação sobre a tese: mantendo o limite de 20 salários mínimos apenas em relação às contribuições devidas a terceiros até outubro/1991.
Segundo esse entendimento (critério cronológico para resolução dessa antinomia aparente de normas), o teto de 20 salários mínimos, previsto no art. 4º da Lei 6.950/81teve vigência e eficácia somente até a entrada a vigor da Lei 8.212/91, que, no parágrafo 5º do seu artigo 28, passou a estabelecer que o salário de contribuição corresponderia ao salário mínimo, sem qualquer limite (R$ 1.081,00, reajustado a partir de 1998 – posteriormente, houve nova alteração pela Lei 9424/96,, revogando o referido art. 4º).
Aliás, nesse sentido é o entendimento do TRF1, onde foi destacada essa questão temporal, tendo sido afirmado que a disposição contida Decreto 2.318/86 não teria alcançado as contribuições a terceiros, de modo que o limite previsto na Lei 6.950/81 teria vigorado até 25.10.1991, isto é, 90 (noventa) dias após a publicação da Lei 8.212/91, que disciplinou a limitação do salário de contribuição. Após aquela data, não haveria que se falar em teto para a base de cálculo das contribuições parafiscais.
Diante da notória divergência de entendimentos dos tribunais, o tema será objeto de julgamento em sede de recurso representativo da controvérsia, no âmbito do STJ, a fim de pacificar o litigio.
Sendo o que nos cumpria informar, seguimos à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos, auxiliando-os no que for necessário.
[1] Blader Henrique de Lira Soares – Advogado, especialista em Direito Tributário (IBET) e em Planejamento Tributário (FACE/UNB). Cursando MBA em Finanças e Controladoria pela USP/Esalq.
[2] Renata Paredes Martins – Estagiária, acadêmica de Direito (IDP).12